Perfil: Dona Amância da Casa das Minas

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Amância Evangelista de Jesus Vieira, cujo nome africano dado na Casa das Minas era Boçuroncoli, foi a primeira vodunsi-he, (filha de santo sem iniciação completa), que dirigiu a Casa das Minas – entre 1972-76 -, após a morte de dona Leocádia e dona Filomena as últimas vodunsis gonjaí que ocuparam este cargo.

Conheci dona Amância em 1974, mas tenho uma foto dela tirada durante uma festa de banquete dos cachorros, em Janeiro de 1973. Na sua época sempre havia festas do Divino na Casa das Minas. Dona Amância lamentava que a Casa, por não ter mais vodunsis gonjaís, não poderia mais preparar tobossis (entidades femininas infantis que vinham em determinadas festas, como na época do Carnaval). Ela faleceu em 08/07/1976 aos 74 anos.

Amância nasceu em 1902 e foi dada para ser criada a dona Anastácia, fundadora do terreiro da Turquia, que a levou para a Casa das Minas, onde Amância foi criada por Mãe Andresa, por Anastácia, e Aneris. Dizem que Aneris perdeu um noivo por se dedicar a Amância que era querida por todos. Ainda criança aos oito anos recebeu seu vodun, Nochê Boça, da família de Dambirá.

Casou-se com um tocador da Casa, mas logo se separou dele e passou a viver com outro tocador Sérvulo Nazaré. Tinha uma filha adotiva, vários afilhados e morou por muito tempo no bairro do João Paulo. Após a morte de dona Manoca, que chefiou a Casa em fins da década de 1960, passou a residir na Casa das Minas. Quando dona Anastácia morreu, Amância foi das que defenderam que o terreiro da Turquia não deveria ser fechado e deveria ser dirigido pelos filhos da casa. Dona Amância era enérgica, tinha o temperamento forte e brigava com muitas pessoas – diziam que ela era “carrancista”.

No Governo Pedro Neiva de Sant´Ana, a primeira dama, dona Enei, visitou a Casa das Minas e solicitou a dona Amância algumas peças para compor um pequeno museu do negro que seria instalado no prédio da Cafua das Mercês, que estava sendo preparado com esta finalidade. Dona Amância doou uma manta de tobossis, um tambor grande, algumas peças de roupas e imagens de santos. Em troca pediu a dona Enei tijolos e telhas para um conserto na parede da cozinha da Casa das Minas, que precisava ser reparada. Esta doação provocou certo mal estar na Casa, pois foi feita sem consultar as demais filhas, mas no dia da inauguração da Cafua dona Amância compareceu com as vodunsis da Casa das Minas. Mais tarde o tambor grande e outras peças foram devolvidas, por solicitação de filhos e filhas da Casa atendido pela Secretaria de Cultura. Amância chegou a ser acusada por alguns de querer vender uma parte do prédio da Casa das Minas à Prefeitura e sua transformação em uma escola. Falou-se também que, por este e outros motivos, quando ela ficou doente, pouco antes do seu falecimento, sua senhora (Nochê Boça) veio nela e falou para as outras vodunsis que não viria mais nela.

Dona Amância costumava citar os nomes e características dos voduns das diferentes famílias na Casa das Minas, especialmente da família de Dambirá, a que pertence sua senhora, Nochê Boça, referidos como “os donos da terra”, que curam a peste e outras doenças. Esta família é chefiada por Acossi Sakpatá, que adora São Lázaro, secundado por seus filhos, Azile, que adora São Roque e Azonce, que adora São Sebastião. Outros voduns desta família são Toi Lepon, Toi Poliboji, Borutoi, Bagono, Alogue, Boça, Boçucó e os gêmeos Roeju e Aboju, que são crianças e fazem o papel de toquenos – voduns meninos, que vêm na frente, chamando os irmãos mais velhos. Nochê Boça protege o irmão Boçucó, que se transforma numa serpente e se esconde num termiteiro. Alogue se transforma num sapo. Há ainda Ewá, que é filha de Azonce e foi assentada na Casa de Nagô.

Dona Amância dizia que no Maranhão sempre houve grande devoção à família de Acossi, pois no passado havia muitas epidemias de peste na região. Lembra que na época em que ela nasceu houve uma grande epidemia na cidade e que, num sobrado de azulejo alí perto da Casa das Minas morreram todas as pessoas da família e o casarão permaneceu muito tempo abandonado.